"Por vezes parece que o meu marido não fala a mesma língua que eu...não me compreende!"
Ao trabalhar com os casais, verifico que frases como esta são muito frequentes. A comunicação entre pessoas é muito complexa e pode gerar grandes confusões e desentendimentos.
Comunicar não é, somente, falar, mas engloba todos os nossos gestos, tom de voz, volume, transpiração, palpitações, tique, etc. Quando dizemos algo a alguém, o outro está atento à nossa linguagem não verbal, muito mais, do que ao que dizemos. É muito diferente eu dizer "Que bonito!" com um tom alegre e um grande sorriso ou com um tom arrastado e um arquear da sobrancelha. A frase é a mesma, mas o que eu quero transmitir é o oposto.
Frequentemente, temos desentendimentos na comunicação, pois todos partimos do princípio que o outro que nos está a ouvir sente o mesmo que nós, experiencia o mesmo. O que não é verdade.
Dentro de nós trazemos as nossas tradições, cultura, hábitos, genética, a juntar aos nossos sentimentos, emoções, formas de pensar e de reagir, preconceitos, pensamentos, julgamentos, categorizações (caixas que organizo na minha mente com categorias, por exemplo: categoria dos sítios agradáveis - praia, mar, piscina, montanhas verdejantes; mas dentro de outra pessoa já pode ser: cidade, movimento, metrópole, arranha céus), vontades, desejos, ambições, enfim. Tudo isto está dentro de mim quando comunico e projecto na forma como falo. Eu posso dizer algo muito positivo e querer transmitir a ideia de que estou muito bem, mas a minha linguagem não verbal comunicar o oposto (gesticulo muito rápido, ou muito lento, num tom de voz elevado ou muito baixinho, a tremer).
No entanto, nós tentamos camuflar o nosso interior, sobretudo para quem não conhecemos. Já com quem temos mais confiança, aliviamos a tensão e quebramos as nossas defesas, projetando com mais nitidez tudo isto. Vejamos o seguinte exemplo: alguém que está sempre a esquecer-se de fechar a porta e já estamos irritados com isso. Se estivermos no trabalho diremos "Pode fechar a porta por favor", com um sorriso, ainda que amarelo, no rosto e um tom de voz o mais calmo possível. Se estivermos em casa já será "Mas quantas vezes é preciso dizer para fechares a porta!" num tom elevado, irritado e ameaçador.
Entre os casais o que acontece, nos desentendimentos, é a junção destes dois aspectos que falei: a comunicação é complexa e envolve tudo o que se passa no nosso mundo interno, bem como pelo facto de estarmos com quem temos mais confiança, baixamos as nossas defesas e mais transparecem as nossas emoções. Neste sentido, é muito comum cenas assim: a mulher chega a casa cansada, repara que a cozinha está ainda com loiça do pequeno almoço, mesa desarrumada, chão para varrer, loiça para arrumar e desorientada desabafa, com as mãos na cabeça "Ai, esta cozinha! Nem sei por onde começar!" O marido olha para ela e responde, descontraidamente, "Olha começa por colocar a loiça na máquina." A mulher a espumar de raiva grita-lhe "Alguém te pediu opinião! Estás a mandar em mim? E se fosses tu a fazer isso!" O marido fica desorientado e pode iniciar-se um serão muito desagradável. O que aconteceu aqui? A mulher estava a projectar todo o cansaço e a desabafar que era muita coisa para ela arrumar e não lhe apetecia nada fazer isso, talvez até esperasse que o marido dissesse que iria ele fazer isso. Mas o marido pensou que ela estava mesmo desorientada e resolveu ajudar dando um palpite. Resultado, a mulher sentiu-se ofendida.
Quando comunicamos temos que refletir sobre alguns pontos:
- identificar a emoção: que estou a sentir, que emoção está dentro de mim? Será boa altura para falar agora? Conhecer-me, identificar e dominar a emoção.
- mensagem: o que quero realmente comunicar, qual o meu objectivo com esta conversa, onde quero chegar?
- clareza e tranquilidade: escolher as palavras com cuidado, para que não haja distorção do que quero transmitir e fazê-lo sem pressas, nervosismo ou tensão.
- empatia e caridade: preciso estar atento ao outro e sentir o que ele sente, pois posso eu estar pronta para comunicar, mas o outro não estar pronto para escutar; perceber o outro para adequar, igualmente, a minha linguagem e forma de falar, para ele compreender melhor.
Sempre com caridade, sem querer ofender, julgar, maltratar, tentar sempre que o outro se sinta amado e não humilhado.
Santa Teresa Benedita da Cruz (Edith Stein) tem uma frase muito interessante "Não aceite nada como verdade se não houver amor. Não aceite nada como amor aquilo que falta verdade". Se o que queremos comunicar ao outro é uma verdade temos que saber dizer com coerência e clareza, e se for uma verdade dolorosa, teremos que ter caridade e empatia, para perceber o outro, sentir o que ele está a sentir e adequar a linguagem para que ele escute bem a mensagem.
Marta Faustino
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